sexta-feira, 18 de julho de 2014

FRITJOF CAPRA E O PONTO DE MUTAÇÃO

A luta contra o racionalismo não se limita ao Direito Processual Civil, nem mesmo ao Direito. Ela atinge a Física, a Medicina, a Psicologia, a Economia e outros campos do saber humano. A Ciência como um todo. A influência do cartesianismo não se limita apenas às instituições jurídicas. 
Faço este post adicional para recomendar a leitura de uma grande obra a respeito da crise do paradigma racionalista e cartesiano nas ciências em geral. Trate-se da obra de FRITJOF CAPRA. Vários são seus livros a respeito (O Tao da Física, A Teia da Vida etc.), todos facilmente encontrados nas livrarias, bibliotecas e sebos. Mas talvez a sua obra-síntese seja O Ponto de Mutação (The Turning Point), bastante acessível e didática.


Permitam-me um extrato desse pungente livro:
A visão cartesiana mecanicista do mundo tem exercido uma influência poderosa sobre todas as nossas ciências e, em geral, sobre a forma de pensamento ocidental. O método de reduzir fenômenos complexos a seus componentes básicos e de procurar os mecanismos através dos quais esses componentes interagem tornou-se tão profundamente enraizado em nossa cultura que tem sido amiúde identificado como método científico. Pontos de vista, conceitos ou ideias que não se ajustavam à estrutura da ciência clássica não foram levados a sério e, de um modo geral, foram desprezados, quando não ridicularizados. Em consequência dessa avassaladora ênfase dada à ciência reducionista, nossa cultura tornou-se progressivamente fragmentada e desenvolveu uma tecnologia, instituições e estilo de vida profundamente doentios (20 ed., p. 226).
Reduzimos o Direito à lei ou a enunciados abstratos da jurisprudência. Procuramos soluções para o sistema processual sem avaliar o funcionamento das instituições judiciárias. Renegamos a interdisciplinariedade. Fragmentamos o fenômeno processual, pensando o processo a partir dele mesmo, ou a partir da ação, ou a partir da jurisdição. Temos dificuldade de conceber o processo holisticamente, como um todo destinado a prestar o serviço jurisdicional com qualidade. O Direito Processual Civil também participa dessa cultura doentia denunciada por Capra. No Brasil, são mais de 90 milhões de processos!!!!!!!!!
Quem o desejar, também é possível ter contato com as ideias de O Ponto de Mutação através do cinema, pelo filme Mindwalk (1990), dirigido por Bernt Capra, irmão de Fritjof: 





Confiram. Os diálogos são ótimos e os atores surpreendentes! Filme de primeira grandeza.
Até o próximo post.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

A LUTA CONTRA O RACIONALISMO NO DIREITO PROCESSUAL

Apresento o pragmatismo como uma importante chave metodológica para a superação do paradigma racionalista do direito processual civil, na expressão consagrada por OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA (1929-2009), em seu Processo e Ideologia, obra magna cuja primeira edição completa dez anos (2004-2014).
Capa da 2ª edição de Processo e Ideologia
 O racionalismo pode ser definido, em termos gerais, como a "atitude de quem confia nos procedimentos da razão para a determinação de crenças ou de técnicas em determinado campo" (ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 821). Para os racionalistas, a fonte primordial do conhecimento é a razão. 
Em palavras mais modestas, o racionalista típico é aquele que acredita que usando apenas o pensamento, sem recurso à experiência, é capaz de produzir um conhecimento verdadeiro dotado, na maioria das vezes, de necessidade lógica e validade universal. Ou, de forma ainda mais simples, "os racionalistas com frequência parecem de outro mundo, no sentido que o mundo que eles consideram como o mundo verdadeiro não é o mundo revelado pelos nossos olhos, ouvidos e pontas dos dedos, mas um mundo descrito através de conceitos abstratos e matemática" (HUENEMANN, Charlie. Racionalismo. Petrópolis: Vozes, 2012, p. 20).
Costumam ser apontados como "pais" do racionalismo: DESCARTES (1596-1650), SPINOZA (1632-1677) e LEIBNIZ (1646-1716).


A construção do Direito Moderno, especialmente após o Iluminismo, foi substancialmente marcado pelo racionalismo. LEIBNIZ  bem demonstra isso quando afirma:
A doutrina do direito é de índole daquelas ciências que não dependem de experiências, mas de definições, não das demonstrações dos sentidos, porém da razão; são, por assim dizer, próprias do direito e não do fato. Portanto, assim como a justiça consiste num certo acordo e proporção, pode entender-se que algo é justo embora não haja quem pratique a justiça, nem sobre quem ela recaia, de maneira semelhante a como os cálculos numéricos são verdadeiros, embora não haja nem quem numere e nem o que numerar, da mesma maneira como se pode predizer de uma coisa, de uma máquina ou de um Estado, que, se tiverem de existir, hão de ser formosos, eficazes e felizes, mesmo que nunca tenham existido. (LEIBNIZ, Gottfried Wilhelm. Los elementos de derecho natural. Madrid: Ed. Tecnos, 1991, p. 70-71)
E é evidente que o Direito Processual Civil, nascido na segunda metade do século XIX, não poderia ficar infenso às influências do racionalismo. O problema é que, até os nossos dias, ainda produzimos soluções processuais confiando exclusivamente nos expedientes da razão, sem dar muita bola aos fatos e ao mundo da experiência. O processo civil, especialmente no civil law, ainda rende tributos ao paradigma jurídico racionalista, como já bem denunciou OVÍDIO BAPTISTA. E considero ser essa a principal causa das inúmeras dificuldades que continuamos tendo para conseguir um sistema processual mais apto e adequado às suas missões democráticas.
Repare bem nas afirmações abaixo. Você não as confirma, ao menos na sua maior parte? Elas buscam caracterizar a adesão do nosso processo civil, de uma forma bem simples e direta, ao paradigma racionalista, da "ciência que não depende de experiências, mas de definições":
1º) Conhecemos o direito processual civil abrindo o Código de Processo Civil, na confiança que de que a lei é o Direito; outras vezes, o concebemos a partir de enunciados abstratos contidos em súmulas ou ementas de julgamentos de tribunais, ignorando por completo o contexto fático por trás dos julgados;
2º) Toda vez que o sistema processual vai mal ou não funciona tentamos resolver o problema através de reformas legislativas (não à toa, vem aí um novo CPC); algumas vezes fazemos tais reformas apenas para melhorar conceitos legais ou dar melhor "sistematização" ao conjunto de dispositivos; 
3º) Não se realizam pesquisas empíricas no direito, nem há diagnóstico de realidade sobre o funcionamento do sistema processual (a não ser o Justiça em Números do CNJ);
4º) Existem milhares de livros de processo civil só no Brasil; os cursos e manuais de Direito Processual Civil costumam ser redigidos em cinco ou mais volumes; todos - as exceções são praticamente desconhecidas - trabalham o processo civil apenas através de expedientes da razão e da lógica, formulando teorias abstratas atrás de teorias abstratas, interpretando artigo depois de artigo, com substrato exclusivo em levantamentos bibliográficos. Os periódicos trilham no mesmo caminho. Quanto mais citações bibliográficas um trabalho tem, mais respeitado ele costuma ser;
5º) As soluções processuais, no âmbito legislativo e judicial, são produto exclusivo de operações de subsunção lógica a partir da lei, conceitos doutrinários ou ementas de julgados. O que não se enquadra na regra, no princípio, no conceito ou na súmula/ementa não pode ser usado ou admitido, ainda que possa representar uma melhoria da prestação jurisdicional no caso concreto. A criatividade é um recurso proibido ou não sabido;
 6º) As contribuições que a administração e a economia podem oferecer para a otimização do sistema processual constituem anátemas ou tema que não diz respeito ao direito processual.

Que tal? Alguma inverdade flagrante? Apesar de todas as ressalvas que generalizações desse tipo merecem, elas compõem um retrato verossímil de como fazemos acontecer o direito processual civil. Muitas outras afirmações poderiam ser feitas a respeito. Uma visão mais larga e aprofundada sobre o paradigma racionalista do processo civil pode ser obtida com a indispensável leitura do livro do Prof. OVÍDIO BAPTISTA, acima indicado (e que carece de uma urgente nova tiragem!!).
O pragmatismo, veremos, é um método tipicamente antirracionalista. Essa é, ao meu ver, a principal característica que o qualifica para nos ajudar na transição para um novo paradigma do processo civil.
Mas, talvez alguém pergunte, o que é paradigma? 
Aguardem o  próximo post!! 

domingo, 13 de julho de 2014

MENOS PROCESSOS, MAIS QUALIDADE NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

Para tratar do pragmatismo como nova proposta metodológica, especialmente para o caso brasileiro, parece-me oportuna uma reflexão preliminar, com base em dados sobre a realidade do sistema processual nacional.
Vejam estas informações do "Relatório Justiça em Números 2013", do Conselho Nacional de Justiça (CNJ): 
Atualmente tramitam pelo Poder Judiciário brasileiro mais de 92 milhões de processos. Nas conclusões do mesmo relatório aponta-se que "a quantidade de processos que ingressam cresce mais significativamente que o quantitativo de sentenças e o de baixas."  Pelos dados gerais de litigiosidade apurou-se que "o estoque de processos do Poder Judiciário aumenta gradativamente desde o ano de 2009, quando era de 83,4 milhões de processos, até atingir a tramitação de 92,2 milhões de processos em 2012, sendo que, destes, 28,2 milhões (31%) são casos novos e 64 milhões (69%) estavam pendentes de anos anteriores."
E não se trata de preguiça ou descompromisso dos juízes. O relatório também aponta que "a cada ano, os magistrados julgam mais processos." Em caráter geral, "os magistrados julgaram mais processos em 2012 que nos anos anteriores. Cada magistrado sentenciou em média 1.450 processos no ano de 2012, 1,4% a mais que em 2011."
Desnecessário dizer muito para constatar que qualquer preocupação séria com o direito processual - e com o futuro da jurisdição e do Poder Judiciário - tem que considerar esses dados da realidade. Todas as soluções para problemas processuais não podem ignorar esses fatos.  
Como será possível esperar qualidade na prestação jurisdicional com um número tão exorbitante de feitos judiciais? Como esperar que os juízes tenham o tempo necessário para bem conhecer, instruir e decidir cada caso posto à sua apreciação?
Nesse quadro de realidade, é realmente difícil atender aos reclamos de todos aqueles que lidam com o sistema processual, seja a doutrina, sejam os advogados, seja a população em geral.
Tenho como certo que o maior desafio para qualquer projeto de otimização do sistema processual brasileiro é diminuir o número de processos, sem diminuir a proteção aos direitos. Conferir melhores condições de julgamento e execução. Tornar o sistema viável. As qualidades de justiça e segurança do sistema processual-judiciário dependem dessa urgente equalização quantitativa.
Como fazer? Aumentar o número de juízes e tribunais? Contratar mais servidores? Gastar mais dinheiro em computadores ou outros recursos materiais? 
O que os processualistas têm a ver com isso?
Os processualistas não podem mais continuar a pensar que esse problema não é seu, que esses números devem preocupar apenas administradores ou especialistas em gestão ou outros setores do saber.
Essa realidade caótica, espelhada pelo Justiça em Números, deve ser enfrentada em níveis mais profundos, sem a escapada tradicional pelo agigantamento da estrutura estatal. 
Esse enfrentamento mais profundo deve chegar às raízes da crise, atingindo as maneiras de fazer acontecer o direito processual. Em outras palavras, urge redimensionar a metodologia empregada para produzir soluções para o sistema processual. Esses números e essa crise ajudam a perceber que os métodos tradicionais até agora formulados são insuficientes ou já estão esgotados.
O pragmatismo é uma ferramenta para essa virada metodológica.




sábado, 12 de julho de 2014

PROCESSO CIVIL PRAGMÁTICO

As suspeitas de que o Pragmatismo - enquanto original contribuição filosófica norte-americana - poderia representar um adequado referencial teórico para a elaboração de um novo método para o Direito Processual Civil nasceram das aulas de Filosofia do Direito, ministradas pelo Prof. Dr. CELSO LUIZ LUDWIG, ainda quando no Mestrado em Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR, 2007-2009). Mas essas suspeitas transformaram-se em projeto de pesquisa para a admissão no curso de Doutorado em Direito na mesma universidade. Após quatro anos de estudos, os resultados das pesquisas de doutoramento geraram a tese intitulada "Processo Civil Pragmático", aprovada em 2013, em banca constituída pelos Professores Doutores SÉRGIO CRUZ ARENHART (Orientador), LUIZ GUILHERME MARINONI, CÉSAR ANTONIO SERBENA, ELTON VENTURI e ÁLVARO PÉREZ RAGONE.
Pretendo, através deste blog, apresentar, paulatinamente, as propostas lançadas nessa tese, e os amadurecimentos que vão se seguindo, propiciando não somente a divulgação das ideias, como também, e principalmente, o seu aperfeiçoamento através das críticas construtivas da comunidade.
Para os que desejarem antecipar o contato com os resultados da pesquisa, acessem o inteiro teor da tese diretamente na internet, no seguinte endereço:



sexta-feira, 11 de julho de 2014

BEM-VINDOS!!!

Bem-vindos ao blog PRAGMATISMO & PROCESSO, destinado à divulgação de ideias, pesquisas e debates sobre as possibilidades de interconexão entre o Pragmatismo e o Direito Processual Civil, visando à construção de uma nova metodologia processual, mais apta e eficiente para fornecer melhores soluções para os problemas do Processo Civil.